O dia 20 de maio de 2019 vai ficar registrado como a data em que um quilo deixou de corresponder exatamente a um quilo. Ao menos o quilo a que estávamos habituado. Não está entendendo nada? A gente explica.
Acontece que quando alguém diz que algum objeto pesa 1 kg, essa pessoa está afirmando que ele tem a mesma massa do IPK, ou como também é conhecido, “Le Grand K”, um cilindro de platina e irídio guardado sob alarmes e sete chaves no Pavilhão de Breteuil, em Paris, onde fica o Escritório Mundial de Pesos e Medidas. Em 1890, o IPK foi eleito como a medida oficial do quilo, e até ontem ele era referência mundial desde balanças de comércio até de grandes indústrias farmacêuticas.
Muitos países têm uma cópia do IPK e, periodicamente, o levam para ser calibrado aos irmãos gêmeos do original em Paris. O IPK brasileiro é a cópia de número 66 e foi recalibrado em abril deste ano, mesmo com a decisão dos cientistas representantes dos 60 países-membros da Conferência Geral de Pesos e Medidas, em novembro de 2018, de que o IPK não seria mais a medida oficial do quilo. Embora aposentado, o cilindro não deixará completamente de ser usado de uma hora para outra, ao menos até que se comprove que a nova forma de calcular e medir a massa são, de fato, mais confiáveis e precisas.
Por que não usar mais o IPK?
Como dissemos, o “Le Grand K” é um cilindro feito de platina e irídio — ou seja, um objeto sujeito às interações com o ambiente e ao desgaste, por mais bem guardado que esteja. Desde 1992, cientistas vinham percebendo que sua massa estava se alterando, e hoje estima-se que ele tenha perdido cerca 50 microgramas. Mas, é claro, essa é uma estimativa, uma vez que ele é a referência máxima para a pesagem do quilograma e não há outro padrão com o qual compará-lo.
Com essas alterações, a comunidade científica concluiu que não era mais possível confiar em um objeto para mensurar uma medida amplamente utilizada no mundo todo, ainda mais quando se considera o impacto que miligramas de diferença podem ter na fabricação de um medicamento ou em uma pesquisa laboratorial. Por isso, determinou-se que o quilo agora será calculado a partir de uma constante matemática, a constante de Planck.
Como medir a massa de um objeto por meio da constante de Planck?
A constante de Planck é uma grandeza que relaciona energia eletromagnética à energia mecânica. Acontece que a constante é muito pequena e, assim, para calcular a massa de algum objeto é necessária uma balança de alta precisão que de um lado suporta o objeto de massa desconhecida e, do outro, uma eletroímã. Ao se estabelecer uma corrente elétrica no eletroímã, cria-se uma força que equilibra o peso do corpo que está pendurado do outro lado.
Essa balança se chama Balança de Kibble, em homenagem ao seu inventor Bryan Kibble, e só recentemente conseguiram criá-la com uma precisão boa o suficiente para substituir o IPK na medida do quilo.
A principal vantagem em relação à medição que era feita pelo IPK é que, por ser calculado a partir de uma constante (que pelo nome já intuímos que não varia), a massa do corpo medido terá o mesmo valor em qualquer lugar do mundo e a qualquer momento.
Mas e na vida do pré-vestibulando, o que muda?
A medição de massa por meio da constante de Planck é uma inovação que permitirá avanços na sociedade principalmente a partir da indústria e da pesquisa — além da maior precisão e segurança, o uso de recursos naturais também será otimizado. É justamente dessa perspectiva, das melhorias promovidas pela ciência ao longo da história, que a mudança do quilograma pode ser cobrada nos vestibulares e no Enem, como explica Carlos Marmo, professor de física do Sistema Anglo de Ensino. Segundo ele, isso “exigirá dos vestibulandos algum conhecimento sobre história e filosofia da ciência e dos seus impactos, positivos e negativos, sobre a natureza e toda a sociedade.”
Além disso, ele lembra também que outras três medidas estão sendo alteradas junto com quilograma (o ampere, o kelvin e o mol) e com isso podem aparecer questões relacionadas à análise dimensional e estimativas de ordem de grandeza. Já a balança de Kibble pode inspirar as bancas a criarem questões envolvendo eletromagnetismo e estática, bastante tradicionais em vestibulares.
Fonte: guiadoestudante.abril.com.br